Maria da Luz: um símbolo de trabalho, força e fé

Aos 70 anos, Maria da Luz, natural de Santa Clara-a-Velha, perto de Sabóia, é uma das vozes que contam a história de gerações de trabalhadores que fizeram do Mercado Municipal um espaço central na vida da comunidade.

A sua trajetória é marcada pelo trabalho árduo, pela dedicação à família e por uma memória viva das transformações sociais e económicas da região. É um ícone de Armação de Pêra.

Maria da Luz deixou a terra natal com apenas 17 anos, rumo a Armação de Pêra. Rapidamente começou a trabalhar na Miramar, um restaurante de referência em Armação de Pêra, situado ao lado da Fortaleza, que descreve com carinho:

«Eu também fui muito feliz aí. (...) Trabalhava das sete da manhã até às duas da noite, mas era um tempo bom, cheio de amizade com as colegas. Se pudesse voltar atrás, voltava», afirma Maria da Luz com um sorriso.

O restaurante encerrou após três de trabalho, mas as recordações permanecem como um dos capítulos mais felizes da sua vida profissional.

Depois do casamento e do nascimento dos filhos, Maria da Luz dedicou anos à vida familiar. Mais tarde, encontrou no mercado municipal uma nova casa:

«Inscrevi-me e vim. Primeiro trabalhei na Praça Velha, vendia na rua. Carregava e descarregava. Depois comprei o meu primeiro carro de carreira e fui ficando até hoje», recorda-se.

A sua rotina começou a ser das seis da manhã até à uma da tarde sem férias, para dar o melhor de si ao público Armacenense e quem visitava o Mercado Municipal.

Durante décadas, assistiu às mudanças do comércio local, desde os tempos em que “havia muita gente e muitos produtos” até à atualidade, em que a concorrência dos supermercados e centros comerciais esvaziou parte da tradição.

Casou-se com 20 anos e logo a seguir teve o privilégio de receber o seu primeiro filho, e aos 26, o seu segundo.

Apesar das dificuldades e perdas pessoais — o falecimento do marido há sete anos e de familiares próximos pouco tempo depois — Maria da Luz manteve-se firme:

«É uma dor que fica, mas vai acalmando. Acho que é Deus que me ajuda a ter força. Vou buscar motivação todos os dias para vir cá», refere a comerciante.

A ligação à família é central na sua vida. Fala com orgulho dos pais e recorda a felicidade da infância.

«O maior orgulho que tive foi ter uns pais maravilhosos. A minha mãe ainda hoje está viva, com 94 anos», afirmou com orgulho.

Quando se pergunta se pretende deixar o seu trabalho, Maria da Luz pensa em desistir, mas que por outro lado pergunta-se, “Mas também o que é que vou fazer para casa?”, ficando com a ideia que enquanto puder continuará a trabalhar.

Além do trabalho no Mercado Municipal, sempre que pode, vai ajudar no restaurante “Zézinha”, visto que as saudades de trabalhar no restaurante Miramar são notórias.

Com todos estes trabalhos, ainda tem a tarefa de cuidar da sua horta e, nos seus tempos livres, de apanhar caracóis.

A história de Maria da Luz é também a história de uma geração que construiu, com esforço, a identidade da vila. Do trabalho incansável no restaurante às madrugadas no mercado, ela personifica a resistência de quem nunca deixou de acreditar no valor do esforço diário.

Apesar de afirmar que «já não tem idade para esperar mudanças na praça», guarda consigo uma certeza: a de que viveu uma vida simples, mas plena.

«Considero que vivi uma vida boa, dentro do possível. Fui feliz na casa dos meus pais, no casamento, no trabalho. Tenho orgulho disso», terminou com um sorriso.